Vida de Vagal




Local: Rec Pool UCD
Acesso: Passe verde / validade 18/08/00
Temperatura: 96F
Delta breeze: ON
Defesas: Banana Boat fator 8 / lipbalm fator 15 / chapéu
Munição: água, revistas, jornal
Extras: $2,75


Tomada  geral:

Meninos  e  meninas  do  Aggie  Summer  Camp. Muitas bóias, canudos de isopor  coloridos  para  guerras  simuladas,  nenhuma sunga masculina, muitos  maiôs  psicodélicos  e jacus, mas nada sensacional ou digno de nota. Nenhuma família de mexicanos fazendo picnic ou barbecue. Noventa por cento dos banhistas são caucasianos. Nenhum brasileiro (se bem que eles  são  os  reis  do  disfarce, se passam por japoneses, libaneses, africanos, europeus em geral. São muito difíceis de identificar a olho nu),  ninguém  falando  espanhol.  Esboço  surpresa. Cadê a comunidade cucaracha?  Ah,  hoje  é  dia  de  semana...  Plena  quarta-feira,  tá explicado!  Resumindo  e  generalizando  total  e irrestritamente, vou concluindo com meus botões e fazendo a seguinte pergunta irônica: Quem é mesmo que trabalha duro neste país, hein??

Concentrando no Jornal:

O  jornal diário (durante o verão é esporádico) do campus da UCDavis é o  The  California  Aggie. Já deu pra reparar que tudo aqui é 'Aggie', não?  Até  uma coreanazinha que eu conheci se chamava Aggie. Também se chamam  os  agrícolas e agrônomos de aggies. Estamos no cinturão verde da  Califórnia,  não  esqueçam.  E  as  notícias no Aggie variam entre esportes  (o time da veterinária da UCD vai trabalhar nas Olimpíadas - eles  vão  cuidar  dos  preciosos  cavalos  das competições eqüestres, deixa-me  explicar.)  e  crimes.  Alguém foi pego pela polícia fumando maconha.  Outro  suspeito  pichou  o BMW da sua vitima com tinta azul. Outro  mijou e se masturbou na frente da casa do vizinho e foi pego no flagra.  Mais um levou uma carcada, porque seu cachorro estava latindo por  mais  de  5  minutos,  sem  parar,  numa altura que chegou aos 52 decibéis  (quem mediu, encafifei?). Mas o pior dos crimes, considerado pela  polícia um grande roubo, foi o cometido contra essa pessoa de 41 anos, residente de Davis, que deixou seu carro estacionado na rua, com as  portas  e janelas abertas e teve seus objetos de trabalho afanados (uma  furadeira,  uma  serra,  um  soprador  de folhas), além de quase perder seu rádio (que o ladrão tentou, mas não conseguiu levar). Como? Só porque alguém deixa o carro todo aberto não quer dizer que qualquer um  pode  tranqüilamente  roubar  o que tem dentro! O que é isso minha gente? Em que mundo estamos vivendo? Daqui a pouco teremos que trancar até  as  portas  das nossas casas! Termino a leitura do Aggie cheia de sentimento de indignação e revolta.

Pessoas  são tão gente:

Um  grupo  de  americanos na minha frente faz uma farofa incrível, com tantas toalhas, cadeiras, bóias, copos e embalagens de Jack in the box e  criançada  correndo  e  gritando.  A mocinha de coque no cabelo tem unhas  longas  pintadas  de  azul.  As unhas do pé também são azuis. O biquíni  tomara-que-caia  bustiê  super  na  moda dos anos 80 também é azul.  O  celular toca e ela atende o aparelho decorado com a bandeira dos  Estados Unidos: listras vermelhas e estrelas azuis. E daí? Eu vim vestindo  uma  camiseta escrito Flora Brasil e não tô nem ai se alguém criticar  meu  patriotismo.  Já o grupo de pessoas à esquerda fala uma língua  que  eu  não  entendo  nem reconheco. Parecem russos, ou algum outro  grupo  étnico daqueles lados do planeta. Uma mulher bem branca, bem  velha e bem enrugada sorri pra mim. Outra de biquíni vermelho com as  alças  caídas  propositalmente me encara. Eu volto a ler a revista que entrevista o John Walters. Os russos começam a recolher as toalhas e  a  mulher  do  biquíni  vermelho veste uma blusa xadrez sem mangas. Enrola a toalha na cintura, tira a calça do biquíni, tira uma calcinha branca  da  bolsa, põe a calcinha, deixa cair a toalha, fica de costas pra  mim,  mostrando a bunda de calcinha transparente, veste o shorts, dobra  a  toalha,  arruma  o  cabelo  numa  presilha  vermelha  e  sai caminhando com a velha sorridente. Nada aconteceu de excepcional. E eu preocupada em manter a postura.

Fim da picada:

Chega por hoje, né? Já li muito, já vi muito, já nadei, minha perna tá vermelha  aqui  do  lado  esquerdo,  droga  de cabelo que fica duro de cloro,  deixa  eu  ir  antes  que  a  meninada do summer camp alague o banheiro  e  eu tenha que nadar meu caminho de saída. Missão cumprida. Desligo, cambio. bbzzzxxzzbxzz...




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